“Na manhã do comício,... catei coisas no chão. Essas que aí estão na ilustração: prego e metais enferrujados, chips e baterias; retrato perfeito de Barbacena, uma cidade oxidada, parada no tempo, em pleno 2010.”
(*) Walter Navarro
Em dois meses e cinco dias, lotado no Comitê de Eventos/Turma do Chapéu da campanha de Anastasia, Aécio, Itamar e Serra; tive o prazer de três fugazes viagens. Por enquanto…
Em dois meses e cinco dias, lotado no Comitê de Eventos/Turma do Chapéu da campanha de Anastasia, Aécio, Itamar e Serra; tive o prazer de três fugazes viagens. Por enquanto…
A primeira foi pro Rio de Janeiro e do ano inteiro, para a passeata do Humor contra a Censura. A segunda para Três Pontas, onde Milton Nascimento engrossou o coro dos contentes e gravou o jingle da campanha. A terceira foi semana passada, dia 10 de setembro, para Barbacena, minha terra natal – terra também de Hélio Costa (mas ele se esqueceu disso) – completando a equipe que preparou a caminhada e mini-comício de Aécio, Itamar e Anastasia (por ordem de discursos), no 11 de setembro de sinistra memória.
Costumo falar e escrever que tenho com Barbacena relação de amor e ódio. Amor que dispensa comentários, ódio que provoca zilhões de outros.
Barbacena, durante mais de dois séculos pagou e paga um preço alto por ser ao mesmo tempo famosa, importante e abandonada.
Amigo meu de lá costuma dizer que Barbacena é uma grande área de lazer e só. Vou além, é tipo uma cidade dormitório, de fins de semana e feriados, quando os filhos pródigos, castigo sem crime ou creme, voltam para visitar os seus.
É triste, e falo em causa própria, ver-se obrigado a deixar a terra onde nascemos para tentar a vida alhures, no caso, a capital, Belo Horizonte.
Barbacena há muito vive de um pequeno comércio que não indica, em momento algum, um belo horizonte à vista. Por falar nisso, pensaram em Barbacena quando a capital de Minas foi transferida de Ouro Preto para BH. Pensaram, só pensaram…
Meu cunhado, coitado, petista, tem outra boa definição para Barbacena e seu comércio: uma pastelaria aqui, seguida de uma loja de 1,99 ali, depois outra pastelaria etc.
Barbacena não tem mais cinema – só no shopping e com horários filhos ingratos – sequer uma livraria. Pergunto-me o que pode ser de uma cidade sem livrarias… Li certa feita, nem assaz antanho, que só a Rive Gauche, em Paris, tinha mais livrarias que todo o Brasil!
Se a situação mudou, não deve ter mudado muito.
Barbacena é apenas uma terra de passagem nos caminhos das Gerais; uma referência na BR040, entre Brasília, BH e Rio de Janeiro. Referência omo os carecas: “Ele tá ali, ó, do lado daquele careca…”.
A Cidade das Rosas acabou e as rosas não falam; assim como BH já foi a Cidade Jardim.
A Cidade dos Loucos… Triste sina de Policarpo Quaresma. A fama vem dos hospícios que a cidade ganhou como “presente” político, como se doidos fossem produto de exportação. De certa forma foram, porque Barbacena, de seus “campos de concentração” oficiais e tolerados, exportava cadáveres para várias escolas de medicina em todo o estado.
Não sei em que Brahmas, em que brumas, Barbacena se perdeu…
Seu tão famoso e cantado céu, fonte de inspiração para pintores do quilate de um Émeric Marcier, ainda é lindo porque inalcançável pela estupidez de seus filhos. Já o legado de Marcier… Nem museu ele conseguiu ter. Em uma entrevista ao saudoso Jornal do Brasil, Marcier revelou a intenção de ter seu espaço no belo casarão Conde de Prados, em frente ao Jardim do Globo, centro de Barbacena. O proprietário, temendo o tombamento da casa, demoliu-a na calada de uma noite.
Lembro-me – sorry por falar de Paris, mais uma vez, mas bela parte de minha vida lá passei – de um programa na TV francesa, sobre o escritor Georges Bernanos que, fugindo da 2ª Guerra Mundial, acabou se fixando em Barbacena. Meu pai referia-se a ele como “o maior escritor católico do mundo”… De repente, ao citar a passagem de Bernanos por Barbacena, a cidade foi definida como sendo apenas um “burgo”… Vê se pode…
Barbacena foi arrasada pela ignorância. Tiradentes, ao lado, teve sorte de ser irrelevante. Durante milênios ficou esquecida, escapou da “mudernização” e hoje é o que é.
Barbacena não teve a mesma sorte. Hoje é povoada por fantasmas e pela assombração de tudo que podia ter sido e que não foi. No lugar de sua história, de seus casarões, levantaram caixotes medonhos com pele de pastilhas e outras lepras. O pouco restante vai ser tombado, não pelo patrimônio histórico, mas pela especulação, o tempo e a estupidez. Só não derrubaram as igrejas porque é pecado.
Cidade pequena, mentes pequenas…
Aécio, Itamar e Anastasia falaram bonito. Elogiaram a cidade e seus cidadãos. Claro, eles não tinham outra opção, mas podem ter ação.
Na manhã do comício, esperando Aécio, Anastasia e Itamar, na Praça da Estação, catei coisas no chão. Essas que aí estão na ilustração: prego e metais enferrujados, chips e baterias; retrato perfeito de Barbacena, uma cidade oxidada, parada no tempo, em pleno 2010.
Aí, assim, sonhando e desfalcado do tango argentino de Manuel Bandeira, caço com aquela do Chico Buarque e Francis Hime, levemente adaptada, mas em CAIXA ALTA:
E se o oceano incendiar/E se cair neve no sertão/E se o urubu cocorocar/E se o GALO for campeão/E se o meu dinheiro não faltar/E se o delegado for gentil/E se tiver bife no jantar/E se o carnaval cair em abril/E se o telefone funcionar/E se o pantanal virar pirão/E se o Pão-de-Açúcar desmanchar/E se tiver sopa pro peão/E se o oceano incendiar/E se o Arapiraca for campeão/E se à meia-noite o sol raiar/E SE MINHA CIDADE FOR UM JARDIM/E se eu convidá-la para dançar/E se ela ficar assim, assim/E se eu lhe entregar meu coração/E meu coração for um quindim/E se o meu amor gostar então/De mim.
PS: Lar, doce Bar…Bacena.
(*) Walter Navarro é colunista do Jornal O tempo e membro da Turma do Chapéu. Artigo extraído do Blog da Turma do Chapéu de 18/09/2010.
Porque será que nossa cidade, nossa TÃO famosa cidade foi abandonada dessa forma? Lendo esse artigo associei minha cidade natal, Barbacena, ao um solo infértil do deserto. Isso porque nada que se planta, surge uma esperança de frutos.
ResponderExcluirComo uma cidade com tal renome na história perdeu-se no destino. Creio que para que algum dia nossa cidade brote, será preciso arraigar outra cultura... outra educação e para isso necessitaremos de investimento de VONTADE dos cidadãos e dos governantes de nosso sertão das rosas pois será uma enorme cidade (é fato que cresce - no sentido demográfico- todos os dias) com poucos recursos, pouca água, um comécio medíocre e uma prefeitura falida. O que vamos concordar, não difere muito dos fotos atuais.
Temos que associar nossa querida Barbacena a uma cidade interiorana que o progresso não alcançou. Não é só em época eleitoral que os problemas e suas respectivas soluções devem aparecer.Nós, os cidadãos, devemos impulsionar uma nova forma de mentalidade onde todos, tanto governantes quanto governados, estaram engajados na árdua missão de recolocar Barbacena no fluxo do progresso.
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