(*) O Globo
A Lei de Imprensa só foi extinta no ano passado, por decisão do Supremo Tribunal Federal. A mais alta Corte do país aceitou o argumento de que o dispositivo constitucional garantidor da liberdade de imprensa e expressão não requer regulamentação.
Logo, aquela lei era inconstitucional. Mas há outros absurdos jurídicos em vigor, como a lei eleitoral, de número 9.504. Sequer ela pode ser enquadrada como "entulho autoritário" legítimo, pois é de 1997. Aprovada quando o país já transitava em pleno estado de direito democrático, esta legislação, no entanto, padece de séria intoxicação de cultura ditatorial.
Censura a piadas
Um dos seus piores efeitos é, na prática, baixar a censura nos programas humorísticos de TV e rádio, além de engessar a cobertura jornalística dos pleitos. A proibição de "trucagem, montagem ou outro recurso de áudio ou vídeo que, de qualquer forma, degradem ou ridicularizem candidato ou coligação" serve de base para a Justiça impedir, por exemplo, o "Casseta & Planeta" (TV Globo), "CQC"(Bandeirantes) ou "Pânico na TV" (Rede TV) de usarem as eleições como fonte de inspiração.
No arsenal jurídico, há multas pesadas e até o poder de retirar o infrator do ar. Seria impensável na mais pujante democracia, nos Estados Unidos. Lá não se impede o humorista de explorar as eleições como matéria prima. Vale relembrar o sucesso dos "Saturday Night Live" inspirados em Hillary Clinton e Sarah Palin. A própria Hillary, com grande fairplay, apareceu em um dos programas da NBC.
Inconstitucionalidade
Há um evidente excesso no Brasil. O professor de Direito Constitucional da Uerj Gustavo Binenbojm, em entrevista ao GLOBO, disse entender que o objetivo da lei seja garantir a lisura das eleições, ao impedir candidatos de cometerem excessos na propaganda obrigatória. Como a lei foi redigida e é interpretada, porém, ela amordaçou os programas humorísticos e manifestações artísticas.
E assim derrapou para a inconstitucionalidade, pois a liberdade de expressão não pode ser sobrepujada por outro diploma legal. A legislação incorre no equívoco de discriminar os meios de comunicação, em prejuízo dos eletrônicos, sob o argumento frágil de estes dependerem de concessão pública para difundir imagens e som.
A concessão, no entanto, se deve a um imperativo técnico - impedir a interferência entre as ondas de transmissão -, e não pode servir de pretexto para a censura de qualquer conteúdo de programas de rádio ou televisão.
Blogs e Sites na Internet
É tão discriminatória a legislação que os sites na internet dos meios eletrônicos sofrem as mesmas restrições, ao contrário das versões digitais dos meios impressos.
Binenbojm fez duas propostas: o Congresso editar nova norma, corrigindo a atual, ou o Tribunal Superior Eleitoral baixar outra interpretação das restrições - este o caminho mais rápido. Nunca é tarde para se cumprir a Constituição, demonstrou o STF ao revogar a Lei de Imprensa.
Opinião da OAB
Para o presidente do Conselho Federal da OAB, Ophir Cavalcante, o artigo 45 da lei eleitoral afronta diretamente o princípio de liberdade de expressão previsto na Constituição. "A Adin é um caminho para corrigir uma situação que não se compatibiliza com o estado democrático", afirmou ele.
No final do mês passado, humoristas e blogueiros que se sentiram afetados pela legislação organizaram um grande ato de protesto no Rio de Janeiro, por considerar tal lei inconstitucional.
(*) Fonte Jornal O Globo
Nenhum comentário:
Postar um comentário